segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

Apoio social em famílias de risco com crianças

Por Cláudia Sousa Andrade

O apoio social, assenta numa base conceptual derivada de três considerações teóricas: a ecologia do desenvolvimento humano (Bronfembrenner), a teoria do apoio social (Cohen & Syme) e ainda a teoria da procura de ajuda (DePaul et al.)
Enquanto a primeira referência conceptual aponta para que o desenvolvimento humano se faz de acordo com diversas dimensões que incluem a pessoa em desenvolvimento, os processos que implicam o desenvolvimento de atividades entre os vários contextos, os contextos que se referem ao ambiente geral em que a pessoa está inserida e à sua organização em vários níveis onde se processa o desenvolvimento da pessoa, e por fim a dimensão tempo que tem a ver com as mudanças que ocorrem nos eventos da vida e que podem influenciar o desenvolvimento da pessoa. [in http://pt.slideshare.net/jbarbo00/modelo-bioecolgico-do-desenvolvimento-de-bronfenbrenner, consultado em 26.10.2016]
Quanto à teoria do apoio social, esta refere-se ao apoio que é trocado ao nível interpessoal e que proporciona a uma pessoa alvo, apoio emocional, apoio instrumental, apoio informativo e formas de feedback avaliativo.
A última teoria analisa as circunstâncias que afetam a decisão de um indivíduo pedir ajuda, a própria natureza do ato, bem como o tipo de trocas de ajuda que é realizado (Dunst & Trivette, citados por Serrano, 2007).
Os mesmos autores referem ainda que as famílias utilizam por um lado recursos sociais (são recursos extrafamiliares, são potenciais fontes de apoio externo) e por outro lado recursos psicológicos (que são recurso intrafamiliares de cada membro da família) como forma de satisfazerem as suas necessidades e lidar com as situações do dia-a-dia.
Trivette et al., referidos por Serrano (2007) apontam que aos efeitos do apoio social sobre as famílias com crianças está dependente de componentes e dimensões específicas as quais se influenciam mutuamente: (1) Apoio relacional, (2) Apoio estrutural, (3) Apoio funcional, (4) Apoio constitucional e (5) Satisfação com o apoio (ver neste blog, post de outubro de 2016 – O conceito de apoio social).
Atendendo às componentes referidas e de acordo com a investigação realizada, o apoio social influencia direta e indiretamente o comportamento dos pais, da família e da criança. Verificou-se que este apoio é sobretudo prestado nas seguintes áreas do comportamento dos pais, da família e da criança: saúde pessoal e familiar, comportamentos e atitudes parentais, perceção parental acerca do desempenho dos seus filhos e ainda no comportamento e desenvolvimento da criança. Verifica-se então que o apoio social tem influência direta, indireta, de mediação ou moderação no bem-estar dos pais, no funcionamento familiar, nas interações entre pais e criança e no comportamento e desenvolvimento das crianças.
Um outro aspeto, citado por Serrano (2007), referindo estudos de Crnic & Stormshak e Dunst et al., é de que nos primeiros anos de vida da criança, o apoio social está indiretamente associado ao seu desenvolvimento. Este aspeto deve-se á influência direta que o apoio social tem sobre a saúde, o bem-estar pessoal e o funcionamento familiar, que têm por sua vez influência sobre os estilos de interação pais-criança e que vão influenciar o comportamento da criança.
Citando Dunst, et al., a mesma autora refere que o apoio social tem influência direta no comportamento do recetor do apoio e influência indireta nas interações com os demais membros da família.
Na mesma perspetiva, os referidos autores, relacionaram variáveis como o apoio informal, o bem-estar pessoal, o funcionamento familiar, as funções parentais e o desenvolvimento infantil, tendo verificado que o apoio social está mais relacionado com o bem-estar e pouco relacionado com o desenvolvimento infantil. Verificou também que são as funções parentais que estão fortemente relacionadas com o desenvolvimento da criança. Sendo assim, torna-se importante, a aposta no fortalecimento das funções parentais, se queremos influenciar o desenvolvimento dos mais pequenos.
Desta forma reiteramos a importância do trabalho junto das figuras parentais, timoneiros da família, como meio de chegarmos às crianças e de assim intervirmos indiretamente no seu desenvolvimento.
Para além disto, temos que as abordagens baseadas nos recursos (ou na comunidade), referem-se a um conjunto de pessoas e organizações da comunidade passiveis de serem possuidores de fontes de apoio e de recursos capazes de corresponderem às necessidades das famílias, dos pais e das crianças, mobilizando assim recursos formais e informais (Serrano, 2007). 
Citando Trivette et al., a autora refere que a expressão dos recursos comunitários tem como significado: redes sociais pessoais, organizações, grupos associativos, programas comunitários e profissionais, serviços profissionais especializados que podem ser usados pela família, pelos pais e pela criança com o objetivo de ter algum impacto positivo em cada um destes elementos.

Fonte:

Serrano, A. M. (2007) A importância do apoio social em práticas centradas na família in Redes sociais de apoio e sua relevância para a intervenção precoce. 16 Coleção Educação Especial. Porto Editora. Pp-78-91

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

As redes de apoio social

Por Cláudia Sousa Andrade
As redes sociais providenciam diversas formas de apoio social e referem-se a um conjunto de indivíduos que prestam informações e cujas ações levam o sujeito a sentir-se amado e considerado, enquanto sente que alguém se preocupa com ele (Brandão e Craveirinha, 2011, citando Cobb). As autoras referem ainda, que são as pessoas que fazem a diferença na vida umas das outras.

Serrano (2007), citando por sua vez Vaux, refere que o apoio social implica por isto um processo dinâmico de transações mútuas, entre uma pessoa e a sua rede social, ocorrendo estas transações no seio de um contexto ecológico.
Ainda segundo os últimos autores, as formas de apoio prestadas correspondem a determinadas ações que os membros da sociedade identificam como esforços, que têm como principal objetivo, prestar apoio a pessoas que dele necessitam e que ocorrem espontaneamente ou por solicitação da pessoa alvo.

Para caraterizar as redes, Serrano (2007) apresenta três dimensões, com base em estudos realizados por Cochran & Brassard. Temos por isso a considerar:
(1) Caraterísticas relacionais: representa aspetos da rede pessoal que afetam diretamente as interações entre os indivíduos. Assim, os autores incluem nesta categoria: conteúdo de cada relação (inclui a troca de bens e serviços, informação, partilha, recreação e apoio emocional); a direção de cada relação (a natureza reciproca do processo de troca e o poder na relação); a intensidade da relação (necessidade de pedir apoio, ou de renunciar a ele em detrimento de outro).
(2) Propriedades estruturais que incluem a dimensão da rede (a ligação pessoal entre indivíduos e a sua diversidade).
 (3) Localização espaciotemporal que inclui a proximidade geográfica e a continuidade dos elementos da rede.

Dunst et al., citados por Brandão e Craveirinha (2011) distinguem dois tipos de redes de apoio:
  •       A rede de apoio informal: inclui os familiares, os amigos, os vizinhos, os colegas e os grupos sociais, tais como associações religiosas, clubes, etc. Este é o tipo de redes que as pessoas que têm necessidades primeiro consultam, uma vez que a preocupação mútua e a afinidade psicológica caraterizam as trocas de apoio social entre cada um dos elementos da rede.
  •      A rede de apoio formal: engloba os profissionais (médicos, educadores, assistentes sociais, etc.), e as instituições (hospitais e centros de saúde, creches e jardins de infância, serviços e programas de estimulação, segurança social), que são organizadas formalmente para prestar apoio a quem dele necessite

Como vimos anteriormente na sua descrição, a rede social é fundamental na prestação de apoio social às pessoas que dele necessitam e a sua inexistência coloca em risco as famílias, os seus elementos e as crianças.

Há ainda a considerar as várias áreas de prestação de apoio pelas redes sociais, que correspondem a ações desempenhadas pelos seus membros para ajudar a pessoa alvo e que são realizadas de forma espontânea ou perante uma solicitação. Desta forma, Serrano (2007) cita vários autores que definiram como áreas de ajuda as seguintes:
  •       Preocupação, assistência, desejo de interação, confiança (Brim);
  •     Apoio emocional, assistência orientada para a tarefa, comunicação da avaliação e expetativa, sentido de pertença (Caplan);
  •        Apoio, aconselhamento, feedback (Tolsdorf)
  •      Apoio emocional, serviço e ajuda material, manutenção da identidade social, informação diversa, acesso a novos contatos sociais (Walker et al.)
  •      Vinculação, troca de serviços, orientação, integração social, sentido de aliança, reafirmação de mais-valia, oportunidade de providenciar cuidados (Weiss).

Referimos desta forma as redes sociais onde se encontram os recursos necessários para se proceder ao apoio social, indispensável para o funcionamento de muitas famílias e seus elementos em risco biopsicossocial.

Fontes:
Brandão , T. M.; Craveirinha, F. P. (2011) Redes de apoio social em famílias multiculturais, acompanhadas no âmbito da intervenção precoce: um estudo exploratório in Análise Psicológica 1(XXIX), pp.27-45

Serrano, A. M. (2007) A importância do apoio social em práticas centradas na família in Redes sociais de apoio e sua relevância para a intervenção precoce. 16 Coleção Educação Especial. Porto Editora. Pp-78-91

segunda-feira, 17 de outubro de 2016

O conceito de apoio social

Por Cláudia Sousa Andrade
Tem-se considerado o apoio social como um meio de intervenção social que tem tido impacto positivo no desenvolvimento humano, funciona como as maiores fontes de ajuda e assistência necessárias para as famílias irem ao encontro das suas necessidades e das necessidades individuais dos seus elementos, funcionando ainda particularmente como uma forma importante de suporte da função parental.
Funciona também como um fator de proteção, visto que apesar de não eliminar os fatores de risco, tem capacidade de filtrar ou amortecer o seu impacto, afectando assim positivamente o bem-estar da família, a saúde e o bem-estar dos pais, a qualidade da função parental, o estilo de interações entre os pais e a criança/jovem e o desenvolvimento da criança.

A ação deste apoio social ocorre de dois modos:
  •    Tem impacto direto nos adultos cuidadores da criança, influenciando as suas crenças, atitudes, comportamentos ou conhecimentos.
  •      Nas crianças o seu impacto é indirecto ou direto, através dos contactos desta com os membros com a rede social dos pais ou cuidadores.
Podemos apontar como refere Serrano (2007), citando Cobb, que o apoio social é a informação que é trocada a nível interpessoal e que proporciona ao individuo diferentes tipos de informação: (1) apoio emocional, que implica que é amado e cuidado; (2) estimado, que implica que é acarinhado e valorizado; e (3) apoio de rede, que implica que é pertença de uma rede de comunicação que envolve obrigações e entendimentos mútuos.

Por sua vez, Brandão & Craveirinha (2011), citam Dunst, para definirem o apoio social como um tipo de ajuda e assistência que tem carater emocional, psicológico, associativo, informativo, instrumental ou material, que é prestada pelos membros das redes de apoio social, influenciando de forma positiva o recetor dessa ajuda. Tal conjuntos de ações vão promover no recetor, situações de saúde e bem-estar, bem como a adaptação aos acontecimentos da vida e ao seu desenvolvimento.
Estes membros das redes de apoio social operam através dos vários níveis ecológicos, nas quias se incluem as relações intimas, relações de amizade, ligações com a família alargada e também outro contactos formais e informais da comunidade.

Tardy, citado por Serrano (2007) sintetiza alguns fatores importantes na construção deste conceito:
  1.   Direção: o apoio social que é dado e recebido
  2.   Disponibilidade: quantidade ou qualidade do apoio que as pessoas têm acesso
  3.   Descrição/avaliação: refere-se ao grau de satisfação das pessoas relativamente ao apoio social que receberam
  4.   Conteúdo: varia com a situação. Apoio emocional, que envolve cuidar; apoio instrumental, que envolve emprestar dinheiro e/ou colocar tempo pessoal ou capacidades à disposição do outro; apoio informativo, que se refere a aconselhamento; e apreciação, que se refere a um feedback avaliativo.
  5.   Rede: dimensão social do apoio; os membros da rede podem incluir a família, amigos próximos, vizinhos, colegas de trabalho, membros de comunidade, profissionais,…

Por seu lado, Brandão & Craveirinha, referem que Dunst et al. sugeriu cinco componentes do apoio social que se encontram subdivididas em dimensões e que incluem:
  1.   Apoio relacional: quantidade de relações sociais existentes;
  2.   Apoio estrutural: caraterísticas de densidade, estabilidade, consistência, frequência de contactos e reciprocidade nas relações, das redes sociais de apoio;
  3.   Apoio funcional: fonte, tipo (material, instrumental, emocional, etc.), quantidade e qualidade do apoio prestado;
  4.   Apoio constitucional: conjunto de necessidades sentidas, recursos disponíveis e congruência entre uns e outros;
  5.   Satisfação o apoio: medida em que o apoio é percepcionado como útil e satisfatório.

Pierce et al., citado por Serrano (2007) considera que o apoio social implica um resultado complexo e engloba os três elementos seguintes: esquemas, relações e transacções de apoio.
  •       Referem que os esquemas de apoio se relacionam com as expetativas que cada um de nós tem acerca da disposição do nosso envolvimento social para providenciar ajuda, caso seja necessário. As crianças cujas interações com os seus pais são responsivas, isto é, envolvem apoio, sensibilidade e as respostas são direccionadas para as suas necessidades, desenvolvem expetativas positivas relativamente à capacidade dos outros para disponibilizarem apoio e aprendem a receber e a disponibilizar apoio elas próprias. Pelo contrário, crianças que não vêm satisfeitas as suas necessidades de apoio pelas pessoas próximas, desenvolvem uma opinião sobre os outros como sendo incapazes de ajudar a suprimir necessidades.
  •      As relações de apoio  referem-se às expetativas que o individuo tem acerca do modo como os outros indivíduos irão reagir no caso da sua ajuda ser necessária.
  •        As transacções de apoio envolvem entre dois indivíduos, transacções comportamentais que devem ser uma das seguintes: (1) tentativa por parte do recetor, de conseguir o apoio de outra pessoa; (2) adoção de comportamentos de apoio por parte de quem o irá prestar; (3) receção de comportamentos de apoio por parte do possível recetor.


Serrano (2007) refere ainda, citando Ryan & Solky, que este apoio se deve traduzir no apoio à autonomia, porque desta forma este facilita o desenvolvimento psicológico e a integração social, ao aumentar a autoestima, a autoconfiança, a realização, a vontade e a vitalidade do individuo. Outros tipos de apoio social, como a assistência financeira, de bens materiais, de ajuda ou orientação devem ser prestados também num ambiente de autonomia, sem qualquer tipo de controlo, de pressão ou de passagem de mensagem de incompetência, pois neste caso, não será vivido pelo recetor como um apoio e não terá consequentemente efeito positivo no bem estar psicológico do recetor.

Fontes bibliográficas:

Brandão, M. T.; Craveirinha, F. (2011) Redes de Apoio Social em Familias Multiculturais, Acompanhadas no âmbito da Intervenção Precoce: Um Estudo Exploratório in Análise Psicológica 1 (XXIX) pp:27-45

Serrano, A. M. (2007) A Importância do Apoio Social em Práticas Centradas na Família in Redes Sociais de Apoio e sua Relevância para a Intervenção Precoce. Coleção Educação Especial. Porto Editora. pp:78-91


quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Qual o papel dos pais no desenvolvimento de cérebro do bebé?

Por Cláudia Sousa Andrade
O ser humano é o único animal que nasce com o cérebro não desenvolvido, que se desenvolve depois do nascimento. Mesmo assim, quando nasce, o bebé traz consigo um conjunto muito útil de instintos imprescindíveis para a sua sobrevivência e orientação para novos envolvimentos.
Também os pais estão programados para amarem e responderem adequadamente às interações do bebé. A maioria dos adultos (e também das crianças) acha os bebés irresistíveis e instintivamente tem o desejo de os cuidar e de os proteger. Os bebés, por sua vez, têm tendência a orientar-se para a cara das pessoas e estão predispostas a ouvir mais os sons humanos do que outros sons.
O desenvolvimento do cérebro está dependente das experiencias precoces, calorosas e da atividade cerebral, isto é, dos estímulos do envolvimento. A maioria dos bebés recebe desde os primeiros dias, através dos instintos parentais que se traduzem em comportamentos como: o toque, o segurar no colo, o confortar, o embalar, no cantar e no falar com ele, que têm impacto biológico no desenvolvimento do seu cérebro. Esta é a melhor forma de estimular o cérebro em crescimento, de promover o desenvolvimento dos genes a alcançar o seu máximo potencial e de fortalecer as conexões nervosas, enquanto ajudamos a criança a adaptar-se ao seu novo ambiente e se processa o crescimento das vias neuronais.
É através das experiências diárias dos pais cuidarem do seu bebé, que surgem grandes oportunidades de influenciar o crescimento do cérebro da criança. O contacto ocular, falar, beijar, abraçar, embalar, afagar e pegar ao colo, contribuem para o reconhecimento de pistas verbais e não-verbais que o bebé aprende a reconhecer, a expressar e a imitar. O carinho e as respostas adequadas e sensíveis para com o bebé, parecem proporcionar-lhe o melhor e mais encorajador envolvimento, que lhes permitir explorarem-no e assim apanharem o principal caminho para a aprendizagem.
É enquanto isto que o nosso bebé digere e associa as informações que lhe permitem construir a base para o desenvolvimento da linguagem, das relações sociais, das ideias, da criatividade e da personalidade.
Mas o cérebro também é plástico, razão pela qual todas as experiências da criança estimulam, quer positiva, quer negativamente as suas conexões nervosas. Uma vez que o cérebro é altamente eficiente, ele desliga neurónios que não são usados, enquanto fortalece as ligações daqueles que são usados consistentemente. Sem ativação neuronal, o sistema fica em um estado de espera com desenvolvimento inadequado. Por outro lado, ambientes enriquecidos podem prolongar o período de maior plasticidade. Este processo é chamado de arborização dendrítica, caraterizado pelo desenvolvimento de sinapses (ligações neuronais) e torna possível um correto desenvolvimento, sendo muito ativa durante a infância.
Entre o nascimento e os 10 anos, o cérebro da criança forma triliões de conexões, que se não forem estimuladas, por experiencias mentais ou físicas, serão desligadas.
Esta plasticidade cerebral e as experiências envolvimentais a que o cérebro está mais suscetível permitem a identificação de períodos críticos do desenvolvimento, identificados como um período em que determinadas aprendizagens podem ocorrer de forme ideal. Fora deste período crítico as aprendizagens podem ocorrer, mas com maior esforço.
A título de exemplo, pode-se afirmar que o período crítico do desenvolvimento para aprender a andar de bicicleta, termina pelos 6 anos e que para a aquisição da linguagem, começa a desligar-se por volta dos 5 anos.

Fonte:


quinta-feira, 18 de agosto de 2016

A dimensão afetiva da parentalidade

 Por Cláudia Sousa Andrade
Tal como referi há três post’s atrás, vamos falar de mais uma dimensão da parentalidade – a afetividade, ou a dimensão emocional.

Sempre que há uma relação entre duas ou mais pessoas, para além dos seus comportamentos e dos conteúdos cognitivos implicados, ocorrem também conteúdos emocionais ou afetivos que vão caraterizar essa relação. A relação pais-filhos constitui-se como um meio por excelência em que as situações emocionais se manifestam com uma variedade e uma intensidade muito própria.

Podemos verificar a existência de emoções negativas que são estimuladas por interações conflituosas, enquanto que interações mais responsivas estimulam emoções positivas entre os pais e as crianças/jovens. Estas emoções variam em intensidade.
A auto-avaliação negativa da sua eficácia parental implica um sentimento global de insatisfação ou de frustração e podem ter origem nas seguintes situações:
  1. Os pais não podem atuar de acordo com as suas ideias (por exemplo, quando consideram que é inadequado reagir a um comportamento problemático da criança, em público);
  2. O temperamento difícil de uma criança, coloca obstáculos à ação educativa dos pais;
  3. O stress, o cansaço e a falta de tempo em comum são situações que podem conduzir a atuações que não consideram ideais;
  4. O contexto em que vivem pode estar caraterizado por normas em que os pais não se revêm, mas têm que atuar em conformidade, para facilitarem a integração social da criança.
Outra fonte de insatisfação ocorre quando há um desencontro no sentido negativo, entre as realizações da criança e as expetativas dos pais.
Emoções negativas também são desencadeadas em pais que inferem que a criança tem controlo sobre o seu comportamento inadequado (Dix et al., citado por Cruz, 2005)
Os mesmos autores referem que o grau de intensidade das emoções negativas está directamente proporcional às interpretações que fazem do comportamento da criança; o humor negativo dos pais implica interpretações dos comportamentos inadequados dos filhos como intencionais e da responsabilidade da criança; estas interpretações negativas, aumentam a probabilidade de os pais reagirem com afeto negativo e de usarem comportamentos de afirmação do poder. Quando há maior irritação ou zanga pela parte dos pais, há também maior probabilidade de usarem estratégias punitivas.

Os pais que infligem maus tratos físicos aos filhos, parecem fazer apreciações de intencionalidade e de controlo dos comportamentos inadequados pela criança. Também os adultos que se percebem a si próprios com pouco poder apresentam reacções de afeto negativo às crianças, em comparação com os adultos que se percebem detentores de poder na relação educativa. 

As emoções parentais são adaptativas e regulam o comportamento do indivíduo. Reações parentais negativas podem não ser desadaptativas, mas pelo contrário suscitar o alcance de uma meta adaptativa, uma vez que que uma emoção só identifica uma relação disfuncional pela sua intensidade e duração.
Também se verifica a influência da afetividade parental no processo de qualidade e bem-estar familiar. Tal como refere Cruz (2005) uma afetividade parental positiva favorece o desenvolvimento da criança, enquanto a hostilidade parental está ligada a fatores de desenvolvimento desfavoráveis.
Assim como os estilos parentais recebem influência do clima emocional, os pensamentos e as ações dos pais na interação com a criança, raramente tem uma conotação afetiva neutra.

O sistema parental está organizado em torno de objetivos: para os pais e para a criança. A parentalidade requer que os objetivos orientados para a criança ativem emoções mais fortes do que os centrados nos pais
As emoções implicam uma avaliação cognitiva prévia, dos benefícios e dos prejuízos dos acontecimentos. Quando os acontecimentos interferem com os objetivos desencadeiam emoções negativas; quando os acontecimentos promovem os objetivos, refletem emoções positivas. A emoção desencadeada reflete a avaliação da situação, das consequências, dos obstáculos, dos recursos, …
Quando há compatibilidade entre os objetivos e comportamentos dos pais e da criança, as interações são harmoniosas, ativa-se um afeto positivo. Quando, pelo contrário não existe compatibilidade, entre os objetivos e comportamentos, surge um conflito e uma emoção negativa. A emoção activada depende assim, da avaliação dos pais relativamente à incompatibilidade de comportamentos e objetivos (por exemplo: incompatibilidade de objetivos e comportamentos como sendo intencional, provoca activação de emoção irritabilidade) e à sua percepção relativamente ao controlo da interação (por exemplo: o sentimento de frustração é sentido na ausência de controlo da situação; satisfação é sentida quando é percepcionado um controlo da situação).

A intensidade com que a emoção é experimentada depende do valor com que a situação é sentida, da perceção do controlo sobre a situação educativa. Nas emoções positivas, a sensação de maior intensidade ocorre quando os objetivos promovidos são valorizados pelos pais e quando os comportamentos da criança são considerados como estando dentro do controlo dos pais. Pelo contrário a perceção de maior intensidade nas emoções negativas ocorre quando os objetivos também são valorizados pelos pais, mas o comportamento da criança foge ao controlo dos pais. 

As emoções atuam na expressão emocional dos pais através de um conjunto de comportamentos que incluem, entre outros, a expressão facial, os gestos e o tom de voz.
Verificam-se mais condições para a vivência de emoções negativas em pais que são oriundos de contextos socioeconómicos baixos, com condições de vida difíceis, com graus de stress elevados e reduzidas fontes de apoio social.


Bibliografia: Cruz, O. (2005) Parentalidade, Coleção Psicologias, 1ª Edição, Quarteto

quinta-feira, 16 de junho de 2016

A dimensão cognitiva da parentalidade

Por Cláudia Sousa Andrade

No último post abordamos as questões relacionadas com outra das dimensões da parentalidade, o comportamento dos cuidadores na sua relação com os seus filhos ou com as crianças que têm a seu cargo.

Os processos cognitivos parentais referem-se à forma como os pais pensam sobre as suas crianças e sobre alguns aspetos da sua educação. De entre esses processos cognitivos podemos distinguir conceitos diferentes como crenças, valores, atitudes e expetativas. A hipótese de que as atitudes e os valores parentais podem influenciar os comportamentos dos pais, bem como o desenvolvimento das crianças impulsionou segundo Schaeffer, citado por Cruz (2005), a investigação sobre a cognição da relação pais filhos.

Goodnow, citado por Cruz (2005) aponta para diversos objetivos, que o estudo das ideias parentais relativas ao desenvolvimento e educação da criança, podem indicar e que são:
  •    O estudo dos processos de pensamento dos cuidadores, vem contrariar a tendência dos estudos do desenvolvimento relativamente à criança e adolescente;
  •     A alteração das abordagens parentais na educação dos filhos, nomeadamente na construção de programa para pais, com base no princípio de que as ideias são determinantes dos comportamentos parentais;
  •     A interiorização de ideias das que melhor promovem a adaptação da criança à comunidade em que está inserida;
  •     O aumento do nível de previsão do desenvolvimento a atingir pela criança, partindo do princípio de que as ideias parentais são determinantes do desenvolvimento infantil e do jovem;
  •   O estudo das relações pais-filhos, assumindo a cognição parental como mediador entre o comportamento educativos parentais e os comportamentos das crianças.
Ao estudar a cognição parental, procura-se assim conhecer melhor a forma como os pais atuam, se sentem e respondem à criança, tendo sempre em atenção o contexto social em que estes se movem.

Em relação à definição dos conteúdos das ideias parentais, Bugental e Johnston, citados por Cruz (2005) distinguem: 
  •  Cognições descritivas (crenças e expetativas face ao desenvolvimento da criança);
  •  Cognições analíticas (atribuições de causalidade)
  • Cognições avaliativo-prescritivas (objetivos, atitudes e valores parentais que reflectem a desejabilidade de determinados comportamentos da crianças ou dos pais);
  • Cognições de eficácia (perceção de autoeficácia face à realidade percebida e à realidade desejada).

Seguidamente segue-se um conjunto de conceitos que tentamos explicitar e que se enquadram no âmbito das ideias parentais, que se traduzem em comportamentos de interação parental.

As atitudes são definidas como uma organização de crenças duradouras a propósito da disponibilidade de um objeto ou situação, perspetivando uma determinada resposta.

Crenças são ideias organizadas que a pessoa aceita como verdade, que têm uma base cultural e que estão implícitas nas atividades de vida diária, nas escolhas, decisões dos pais e que funcionam como modelos de ação.

Os valores definem os objetivos que vale a pena perseguir e referem-se a caraterísticas que os pais acham importante que os filhos apresentem. Desta forma, distinguem-se: valores de autonomia e autodireção (afirmação pessoal, responsabilidade, consideração pelos outros, curiosidade, imaginação e autocontrolo), em pais de níveis socioeconómicos mais elevados e mães mais democráticas; e valores de conformismo (obediência, limpeza, boa educação, boas notas escolares e submissão a normas), de pais de nível socioeconómico mais baixo e de mães mais punitivas.

Os objetivos identificam-se com os resultados que os pais esperam conseguir enquanto interagem com os filhos. Estão relacionados com as ambições e os valores pessoais dos pais e podem ser caracterizados de acordo com a variável tempo: objetivos de longo termo e de curto termo, bem como, o que os pais querem dos seus filhos (satisfação das necessidades dos pais – posição mais egocêntrica), ou o que os pais querem para os seus filhos (satisfação das necessidades da criança – posição mais altruísta).

Os calendários desenvolvimentais correspondem aos julgamentos feitos pelos pais, relativos ao aparecimento ou desaparecimento de algum comportamento, à antecedência de determinada competência em relação à outra ou à inclusão do comportamento de criança em determinado estádio ou período critico.

As atribuições de causalidade consistem na avaliação que os pais fazem relativamente às causas que as ações suscitam.


Estes representam os principais processos cognitivos parentais, que têm influência no processo de desenvolvimento de crianças e adolescentes.

Fontes bibliográficas: Cruz, O. (2005) Parentalidade . Quarteto. Coimbra

quinta-feira, 19 de maio de 2016

A dimensão comportamental da parentalidade

Por Cláudia Sousa Andrade

Quando falamos de parentalidade, temos que observar as suas três componentes que são: o comportamento (aquilo que os pais fazem na sua relação com os filhos); a cognição (refere-se ao que os pais pensam de e na sua relação com os seus filhos); e por fim a afetiva (referente ao que os pais sentem na relação com os filhos).

Hoje vamos falar apenas dos aspetos comportamentais da parentalidade e de como eles se traduzem na relação com os filhos. Nesta dimensão podem considerar-se dois tipos de abordagem essenciais nos comportamentos educativos e nas estratégias de sociabilização: as abordagens em termos de interação pais-filhos ou de cuidadores-educandos e as abordagens das técnicas disciplinares.
Relativamente à abordagem das interações pais filhos, temos que considerar o controlo parental, como um conjunto de técnicas empregues por uma pessoa (cuidador) com o intuito de mudar o curso da atividade de outra pessoa (criança ou jovem) (Shaffer & Crook, citados por Cruz, 2005). Este pode ser autoritário ou restritivo (controlo psicológico do estilo parental autoritário, que estimula na criança comportamentos de medo, dependência, submissão e passividade), o controlo parental relaxado (do estilo parental permissivo em que os cuidadores tendem a comportar-se de forma não punitiva e aceitante, face aos impulsos, desejos e ações da criança) e um controlo firme (que estimula na criança um sentido de controlo sobre o envolvimento, promovendo um sentimento de eficácia; estimula ainda na criança a independência, a individualidade, a responsabilidade social e a obediência) (Cruz, 2005).

Em termos da abordagem relativa aos comportamentos disciplinares, podemos dizer que se refere a um comportamento que é utilizado pelos cuidadores, como resposta a um comportamento da criança, considerado indesejável do ponto de vista social, moral ou convencional, isto é, susceptível de criar um conflito de interesses ou desejos da criança e os requisitos das normas e valores afirmados pelos cuidadores. Nestas condições, o cuidador é sempre detentor de maior poder nesta relação[i].
As categorias de comportamentos disciplinares educativas parentais são as seguintes:

Técnicas de afirmação de poder: inclui todas as técnicas que implicam directamente a aplicação de uma força explicita como a punição física e não física (retirada de objectos ou privilégios), ameaças de punição e dar ordens sem explicação. A autoridade parental e a posição de poder dos cuidadores, justifica a frustração das necessidades e desejos da criança/jovem. Este tipo de técnica parece não ter efeitos duradouros na integração de regras de conduta, ameaçando a autonomia e a liberdade de ação da criança/jovem ao exigir a alteração do seu atitude e dando por isso origem a comportamentos de agressividade, de oposição e a sentimentos de hostilidade.

Técnicas de retirada de afeto: implicam comportamentos parentais tais como desaprovar, ridicularizar e ignorar a criança/jovem, exprimir frieza, desapontamento e desinteresse. O princípio subjacente é o de que os cuidadores têm o poder para gratificar ou não a criança/jovem, do ponto de vista afetivo, material e físico. Tal como nas técnicas de afirmação de poder, a criança/jovem cumprem as exigências que lhes são impostas, para evitar as consequências que daí advêm. A punição com retirada de afeto à criança, vai intensificar as suas necessidades de aproximação aos cuidadores com vista ao restabelecimento da relação afetiva. Esta técnica só tem efeito, dependendo da qualidade do afeto retirado (Sears, et al, citados por Cruz, 2005), Esta técnica não está associada á (Cruz, 2005)

Finalmente, temos as técnicas indutivas que correspondem a uma forma não punitiva de disciplina, em que os pais tentam raciocinar com a criança, com o objetivo de que esta entenda porque necessita seguir regras e normas, porque é que as transgressões são erradas e como podem alterar o seu comportamento para que não haja erros de futuro e para que possa reparar prejuízos. Esta técnica é desenvolvida por meio da comunicação verbal, através da qual, o cuidador dá explicações factuais sobre constrangimentos físicos, utiliza constrangimentos morais, regras de conduta, princípios e valores, apela ao orgulho, ao esforço para fazer as coisas bem, à reparação do mal causado, ao sentimento de culpa e também, a atribuições e explicações das consequências do comportamento para outras pessoas ou objetos. Pode afirmar-se que a indução encoraja a criança a aceitar responsabilidades pelas suas ações e a verificar o ponto de vista do outro (Cruz, 2005)

Os cuidadores têm tendência a utilizar estas técnicas em conjunto, tanto de forma sequencial como em simultâneo.



[i] A perceção que os cuidadores têm de si próprios como possuindo pouco poder em relação à criança, pode levá-los a entender o comportamento desta como ameaçados, desencadeando maus-tratos (Bugental, citado por Cruz, 2005)


Bibliografia:
Cruz, O (2005) Parentalidade 1ª Edição. Coleção Psicólogos. Editora Quarteto, Coimbra, junho 2005